Pacientes, médicos e investidores possuem expectativas, muitas vezes, distintas sobre resultados de estudos clínicos. Enquanto os pacientes querem um medicamento experimental que funcione, os doutores têm suas crenças sobre qual remédio funciona melhor e os patrocinadores dos estudos apenas ganharão retorno se o teste for bem sucedido.

Para que tudo isso aconteça, é preciso criar um método que seja o mais neutro possível e não seja afetado por todas essas expectativas. Por enquanto, portanto, os estudos são feitos cegamente, o que significa que nem os médicos, ne os pacientes sabem quem está recebendo remédio ou quem está recebendo placebo ou outro medicamento.

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No entanto, na era da internet, manter esse segredo tornou-se um pouco mais difícil. Com as redes sociais ficou mais fácil para os pacientes comunicarem-se com outros que recebem o mesmo tratamento e comparar resultados. Desse modo, eles podem descobrir qual medicamento estão recebendo e, consequentemente, o teste deixa de ser “cego”, o que pode afetar os resultados.

Se o estudo comparar um novo medicamento e um placebo, por exemplo, os dois tratamentos devem idealmente parecer iguais em todos os sentidos. Desta forma, os participantes só podem adivinhar o que estão recebendo: alguns desses palpites estarão corretos, a maioria não estará.

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Se ele falhar em manter essa condição, o estudo será considerado tendencioso. E um resultado tendencioso não é útil para tomar decisões sobre drogas. Para autorizar o seu uso, os reguladores farmacêuticos exigem uma estimativa fiel dos efeitos do tratamento, e tão neutra quanto possível

O sucesso desses experimentos, até o momento, dependeu, em grande medida, dos participantes fazerem suas suposições sozinhos. Se os pacientes pudessem comparar suas próprias experiências e dados de saúde, seria muito mais fácil adivinhar o próprio tratamento: se eles estivessem recebendo tratamentos diferentes, os efeitos provavelmente também seriam diferentes.

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Embora as redes sociais tenham facilitado muito a comunicação entre os participantes do estudo, em 1980, o teste do AZT, o primeiro retroviral de sucesso contra a AIDS, deu uma pista do que poderia acontecer quando os pacientes se coordenassem. Muitos pacientes com HIV nos EUA participaram das campanhas pelos direitos dos gays nos anos 70. Portanto, eles entraram na luta contra a AIDS como uma comunidade e, quando o estudo começou, eles estavam juntos.

Ninguém queria tomar o placebo, então os pacientes trocavam comprimidos e faziam com que eles fossem analisados por químicos e desistiram do experimento se não pudessem acessar o AZT. Eles quebraram o protocolo de teste de uma maneira que fez a Food and Drug Administration (FDA, o equivalente à Anvisa no Brasil)) dos EUA reconsiderar seus padrões de teste. O estudo foi cancelado antes da hora também.

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Até agora, esse grau de coordenação era uma exceção, mas a internet mudou isso. Existem grupos no Facebook direcionados a pacientes em estudos clínicos, que conversam e comparam resultados nele. Um exemplo é o PatientsLikeMe, um grupo que, em 2011-2012, reuniu pacientes de um ensaio clínico inicial para compartilharem suas experiências no testes. Existiam até mesmo pessoas que compartilhavam receitas caseiras do medicamento nestes grupos. 

Mas o que isso significa para os estudos clínicos de novas drogas? Provavelmente, daqui para frente, os realizadores deles terão que encontrar um novo método para atingir a neutralidade, considerando que com o crescimento das redes sociais, tornou-se impossível manter os participantes completamente “cegos”. 

Enquanto isso, a experiência fica afetada e prejudica a aprovação de novos medicamentos que poderiam salvar milhares de pessoas doentes. A menos que os estatísticos encontrem novas maneiras de lidar com dados não-cegos, as decisões dos pacientes e os médicos, que dependem de evidências de ensaios clínicos, serão consequentemente afetados.

Fonte: The Next Web