Todo domingo é a mesma história. A internet vai à loucura enquanto assiste “Game of Thrones” e comenta ferozmente sobre o episódio nas redes sociais. Uma hora depois, começam as críticas: o público vai procurar o serviço de streaming HBO Go e começa a receber as mensagens de que não é possível reproduzir o conteúdo.

É um sintoma da falta de preparo da HBO para lidar com tantos acessos ao mesmo tempo, e que tem se repetido há muito tempo; as falhas não vêm de agora e certamente não acontecem apenas no Brasil, e já poderiam ser verificadas nas temporadas anteriores do seriado mais popular da empresa. Isso faz com que aqueles que só têm acesso à plataforma de streaming só tenham o acesso ao conteúdo com alguns dias de atraso, o que traz alguns transtornos, especialmente relacionados aos tão temidos spoilers.

Não precisa de muito para entender o que acontece por trás dos panos. A HBO não consegue lidar com volume insano de usuários que aparece de uma hora para outra e seus sistemas simplesmente entram em parafuso. O resultado é que ninguém consegue ver o episódio até a demanda diminuir e a carga sobre os servidores começar a afrouxar.

No mundo da computação em nuvem, existe um termo chamado “elasticidade”. É uma forma elegante de falar sobre uma infraestrutura que se ajusta de acordo com a demanda, permitindo redução de custos. Empresas como Microsoft, com o Azure; Amazon, com o AWS; e Google, com o Google Cloud, batem nesta tecla, afirmando que suas plataformas são amplamente elásticas, indicando que podem suprir um surto de demanda em pouco tempo. Neste sentido, fica evidente que o serviço da HBO não é elástico o bastante.

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Mas isso pode ter múltiplos motivos, e não necessariamente eles têm a ver com a infraestrutura, que podem ter a ver com a incapacidade do próprio aplicativo não ser capaz de se adaptar à alta demanda. A aplicação pode não ter sido desenvolvida com a escalabilidade necessária para aguentar uma pancada repentina nos servidores que acontece todas às noites de domingo. “Não adianta ter muitos servidores se o código da sua aplicação não está preparado para essa demanda. Você pode usar AWS, Google Cloud, Microsoft Azure, e isso não vai adiantar”, explica Bruno Abreu, fundador da Sofist, uma empresa especializada em prevenção de problemas em serviços digitais.

Existem alguns sinais de que o serviço não tenha sido muito bem projetado. Um exemplo é que os usuários sequer conseguem se autenticar para entrar no HBO Go nestes momentos de alta atividade. Segundo Abreu, isso indica que não houve a preocupação em desenvolver uma arquitetura distribuída, que permitisse que outros recursos se mantivessem no ar mesmo se a transmissão de vídeo estivesse prejudicada.

A comparação com a Netflix é óbvia e inevitável. A Netflix conta com 110 milhões de assinantes pelo mundo e roda sobre a plataforma de nuvem da AWS. A questão é mostrar que uma aplicação bem projetada sobre uma infraestrutura bem dimensionada pode aguentar mesmo o mais pesado dos impactos.

E a solução?

Abreu conta que uma possível explicação para a incapacidade do HBO Go lidar com o aumento súbito de demanda pode estar na falta de simulações que permitem realizar uma preparação adequada para o surto de audiência. Assim, seria possível fazer o dimensionamento adequado do que seria necessário para suprir a demanda sem grandes engasgos.

No entanto, entra aí o questionamento: a empresa tem interesse em fazer esse teste, que pode custar caríssimo? Afinal de contas, o HBO Go não é urgente, e os usuários podem simplesmente esperar até outro dia para assistir ao último episódio de “Game of Thrones”. Assim, talvez a empresa sequer tenha o interesse em fazer um investimento desse porte no momento e prefira causar um pouco de frustração aos usuários a gastar uma fortuna para corrigir o problema.

Existe uma solução simples e barata, ainda que bastante grosseira, que poderia ser adotada imediatamente, mas que provavelmente não deixaria os assinantes muito satisfeitos. Já que a empresa não consegue suprir a demanda no momento de pico, ela poderia, por exemplo, criar uma fila de espera para assistir ao episódio, como acontece com a compra de ingressos em shows muito disputados.

Claro, essa opção seria também bastante rústica e uma declaração de derrota da HBO, mostrando que realmente não é capaz de lidar com a alta demanda de tráfego. Ao mesmo tempo, ao menos alguns usuários conseguiriam assistir ao conteúdo desejado no domingo, em vez de ninguém conseguir ver nada. Aqueles que não conseguissem reproduzir o episódio imediatamente ao menos seriam informados sobre a demora e teriam a opção de esperar sem precisar ver telas de erro constantes ou simplesmente optar por tentar novamente em algum outro momento.

O que consumidores podem fazer?

Usuários que se sentirem lesados pela HBO por não conseguirem usar o serviço de streaming aos domingos devido aos constantes travamentos podem pedir parte do dinheiro de sua assinatura de volta, informa o Procon-SP.

A fundação tem recebido queixas de vários assinantes do serviço, e informado que, segundo o Código de Defesa do Consumidor, é possível pedir o abatimento proporcional relativo aos dias em que o serviço não funcionou corretamente. Além disso, também é possível solicitar o cancelamento do contrato sem pagamento de multas.